terça-feira, 26 de abril de 2011

Antes da internet

ANTES DA INTERNET

     Já tenho lá minha idade, não muito avançada, mas considerável, quando me reúno com amigos conversando, vire e mexe surge uma frase do tipo: “onde eu cresci tínhamos pouca coisa, não havia internet, nem nada”. Ora esta frase dá que pensar. Os meus filhos perguntam-me a mesma coisa: como era o mundo antes da internet?
     Os mais novos podem não acreditar, mas não vivíamos em cavernas.Vivia-se muito bem, valorizava-se o conhecimento e a informação, porque era mais difícil de obter, e tínhamos acesso às notícias em tempo real, por incrível que pareça, através dessas duas invenções extraordinárias: a televisão e a rádio.
     Basta olhar para a forma como os jovens realizam hoje os trabalhos de grupo: fazem pesquisa na internet, cada um na sua casa, contactam-se por MSN e depois guardam o trabalho numa pen. No meu tempo reuníamos-nos na casa de um colega (aquele com a maior casa e uma mãe que estivesse disposta a fazer um lanchinho) para o “trabalho”, seguíamos para a biblioteca (que por mais incrível que pareça ,ainda existem?) para recolher a informação, pagávamos a lojas para tirarem fotocópias (as impressoras eram coisas de milionários) e juntávamos tudo em papel, cartolina, colagens, com muito trabalho e suor.
     Sem comentar tudo que vinha junto com os trabalhos, as parcerias, amizades indissolúveis, brincadeiras, combinados, segredos... Tínhamos laços. Nossa como era o mundo sem internet.
     Quando se generalizou o uso do telemóvel, passamos a uma nova escala da evolução humana onde o braço anda colado ao ouvido, num estado de semi-alienação. Até os miúdos de 9 e 10 anos têm um celular nos dias de hoje, para “segurança”, dizem os pais. Não sei se sabem, mas há 20 anos as crianças eram constantemente raptadas, assassinadas e violadas, ou perdiam-se no regresso da escola em matas escuras habitadas pelo Lobo Mau, e comidas. Sim, como era difícil a vida antes do telemóvel.
      Agora juntaram-se os dois impérios do mal, e já é possível aceder à internet através do celular. “Apenas à distância de um click”, como anunciam orgulhosamente aquelas empresas de telecomunicações. Antes ter cultura geral era visto como uma vantagem, uma coisa dos intelectuais. Mas para quê memorizar tantas datas e fatos quando se podem encontrar em menos de 30 segundos na internet? Começa a ser difícil explicar aos adolescentes o que é “um livro”. Antes podíamos dizer-lhes que é uma revista com mais folhas e sem imagens, mas um dia vamos ter que lhes explicar que é como “a internet impressa numa árvore”. E eles vão achar muito estranho.